12 agosto 2009

O quarto (e eu)






Meu quarto está escuro. Falhou a luz que há tempos anunciava a velhice. À luz de velas escrevo agora. Com um grito que só silencia porque me convenço que viver é enfim bom. Os olhos ardem junto ao corpo meio sem força e descansado. Não sou personagem, não possuo nome e nem identidade. É sempre melhor ausentar-se das responsabilidades quando não se carrega um nome.
É noite adentro e só vejo meus olhos pesados e livres, que me olham assustados e pedem mais um trago. E trago. Trago ao vivo e sopro simultâneo aos dedos deslizando sobre a tinta que discorre em palavras. Estas que não dizem nada. Aliás, os meus olhos me dizem que tenho medo de mim e por isso me atraio por mim mesma.
Gosto do medo, gosto da atração... Ambos são desafios relativamente fáceis e de gostosa execução. O cachorro brinca querendo chamar atenção, e quase no instante em que o ignoro penso que um dia não o terei por perto. Desapego o caderno e vou dedicar carinho ao que me pede. Em pouco ele está satisfeito e volto ao meu mundo iluminado apenas por uma vela. As sombras que envolvem os móveis ficam mais visíveis. O foco é outro. Não há foco. Não há precisão. Não há futuro e nem passado. O quarto anda amarelado e eu só. O quarto pesado e eu vazia. O quarto grande e eu sem espaço para fugir. O quarto lento e eu agitada por uma náusea inexplicável. O quarto aqui e eu também, sem pensar em longas caminhadas; em barros na sandália e sem vontade de dormir.

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