Há muito já não convinha culpar o mundo por sua inutilidade na sociedade. Conformado em sua própria escolha se limitava ao comando do destino: O azar dos dias ruins que ia dormir sem ter pego em dinheiro algum, com a barriga e o pensamento vazios. Ou a sorte dos dias bons: quando alguém concedia uns trocados pra lhe suprir a vontade de fumar, e se a fome incomodasse mais que o vício comprava um pão na esquina e sentia-se um pouco menos humano. O pão lhe causava a impressão de esmola, fazia-o lembrar que não tinha uma mesa para sentar e menos alguém para compartilhar a janta, saía porém com a sensação de dever comprido, ao menos por hora não se preocuparia em não morrer de fome, pechinchando apenas a nicotina.Caso alguém perguntasse o seu nome, embora hesitasse em dizer, não havia dúvida : “Pode me chamar de menino”.Teve que inventar o próprio nome e sem muito esforço escolheu aquele que ecoava em sua mente como única lembrança importante de sua mãe. Sempre suja, fumando cigarros vagabundos, passava pelas calçadas a esmo e chamava-o de menino. Mas ele saía indiferente a qualquer passado, sabia que não havia nenhuma estrela no céu que representasse os seus, aliás nem acreditava que tivesse um dia família, por isso sentia que era diferente e podia jurar que nasceu ao acaso, sem nenhum planejamento e nenhum riso que consolidasse uma nova vida. Assim como foi a morte de sua mãe, sem lágrima que representasse o fim ou a saudade. A solidão já estava escrita em seus versos, a tentativa de aproximação com alguém lhe causava tédio e náusea.Gostava de ser só, preferia assim. Tinha alguns amigos que vagavam pelos sinais da cidade. Na verdade trocava com estes momentos rápidos de prosa e aceitava também uma “roda de boca” era como chamavam a reunião para ingerir, por uma necessidade ideológica, algum tipo de “fuga da realidade”. Fumavam, bebiam, cheiravam por horas e ele apenas seguia o seu caminho sem rumo e sem pressa de chegar a canto algum. Roginho era o que mais confiava, era o único que se dava ao luxo de prolongar a presença. Certo dia, ambos tramaram um assalto, combinaram e se divertiram com as diversas possibilidades do erro, e até pensavam em desistir quando Menino ,amedrontado, falava em polícia, na perda da liberdade. Rogi era mais ousado e pretendia sair da miséria, tinha sonhos e confiava em si “Não merecemos tal situação! Isso não é justo! Onde está Deus agora? Eu vou roubar e não tenho culpa por isso!”. Era determinado e se especializou na vida fácil. Menino participou de algumas delas, mas não tinha a vocação. Numa tarde de quarta-feira sentou-se na parada de transporte coletivo e apanhou um jornal que voava pelo chão, no momento que abriu pôde se divertir sem constrangimento, não entendia o que estava escrito ali, mas havia algumas fotos e a sensação de ser um homem que lia um jornal em plena luz do dia era transformada em risos incontroláveis e inocentes. Menino ficou ali por um longo tempo, mesmo não percebendo não estava só: As pessoas acompanhavam com curiosidade àquela cena que não tinha nada demais.
03 outubro 2009
Menino da rua
Há muito já não convinha culpar o mundo por sua inutilidade na sociedade. Conformado em sua própria escolha se limitava ao comando do destino: O azar dos dias ruins que ia dormir sem ter pego em dinheiro algum, com a barriga e o pensamento vazios. Ou a sorte dos dias bons: quando alguém concedia uns trocados pra lhe suprir a vontade de fumar, e se a fome incomodasse mais que o vício comprava um pão na esquina e sentia-se um pouco menos humano. O pão lhe causava a impressão de esmola, fazia-o lembrar que não tinha uma mesa para sentar e menos alguém para compartilhar a janta, saía porém com a sensação de dever comprido, ao menos por hora não se preocuparia em não morrer de fome, pechinchando apenas a nicotina.Caso alguém perguntasse o seu nome, embora hesitasse em dizer, não havia dúvida : “Pode me chamar de menino”.Teve que inventar o próprio nome e sem muito esforço escolheu aquele que ecoava em sua mente como única lembrança importante de sua mãe. Sempre suja, fumando cigarros vagabundos, passava pelas calçadas a esmo e chamava-o de menino. Mas ele saía indiferente a qualquer passado, sabia que não havia nenhuma estrela no céu que representasse os seus, aliás nem acreditava que tivesse um dia família, por isso sentia que era diferente e podia jurar que nasceu ao acaso, sem nenhum planejamento e nenhum riso que consolidasse uma nova vida. Assim como foi a morte de sua mãe, sem lágrima que representasse o fim ou a saudade. A solidão já estava escrita em seus versos, a tentativa de aproximação com alguém lhe causava tédio e náusea.Gostava de ser só, preferia assim. Tinha alguns amigos que vagavam pelos sinais da cidade. Na verdade trocava com estes momentos rápidos de prosa e aceitava também uma “roda de boca” era como chamavam a reunião para ingerir, por uma necessidade ideológica, algum tipo de “fuga da realidade”. Fumavam, bebiam, cheiravam por horas e ele apenas seguia o seu caminho sem rumo e sem pressa de chegar a canto algum. Roginho era o que mais confiava, era o único que se dava ao luxo de prolongar a presença. Certo dia, ambos tramaram um assalto, combinaram e se divertiram com as diversas possibilidades do erro, e até pensavam em desistir quando Menino ,amedrontado, falava em polícia, na perda da liberdade. Rogi era mais ousado e pretendia sair da miséria, tinha sonhos e confiava em si “Não merecemos tal situação! Isso não é justo! Onde está Deus agora? Eu vou roubar e não tenho culpa por isso!”. Era determinado e se especializou na vida fácil. Menino participou de algumas delas, mas não tinha a vocação. Numa tarde de quarta-feira sentou-se na parada de transporte coletivo e apanhou um jornal que voava pelo chão, no momento que abriu pôde se divertir sem constrangimento, não entendia o que estava escrito ali, mas havia algumas fotos e a sensação de ser um homem que lia um jornal em plena luz do dia era transformada em risos incontroláveis e inocentes. Menino ficou ali por um longo tempo, mesmo não percebendo não estava só: As pessoas acompanhavam com curiosidade àquela cena que não tinha nada demais.
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